12 anos de GEICT, 9 anos de Workshops
No último dia 11 de setembro foi realizada a nona edição do Workshop do GEICT, no Instituto de Geociências da Unicamp. O evento é organizado por pesquisadores do próprio grupo desde sua primeira edição e foi realizado com diferentes formatos no passado. Quando foi criado, seu propósito era construir um espaço para que as pesquisas do grupo pudessem ser debatidas por pesquisadoras e pesquisadores externos. Ao longo dos anos, contudo, o workshop se tornou menos um evento interno e mais um espaço para criar pontes entre o GEICT e outros grupos do campo de Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia (ESCT), ou, como no inglês, Science and Technology Studies (STS). Pelo menos duas de suas edições foram feitas em parcerias com outros grupos, como o LE-E da UFSCAR e o CIRIS da Unicamp. Além disso, nas entrevistas feitas pelo blog durante o evento deste ano, um dos professores convidados disse que há conversas para que o próximo evento seja feito em parceria com o CTP, da UnB.
Para o evento de 2023 a organização apostou num formato inédito, em dia único. Ao invés de um formato de apresentação individual semelhante a um congresso, o evento foi estruturado em grupos de estudos menores. Pela primeira vez também, o evento teve uma temática única previamente definida para orientar a formação dos grupos menores: Métodos CTS na prática. Conversei com Lucas Nishida, um dos membros da comissão organizadora, para entender o que motivou essas escolhas.
Para Nishida, doutorando do Departamento de Política Científica e Tecnológica, a comissão identificou que tomar decisões sobre metodologia é uma das principais dificuldades que os pós-graduandos têm ao fazer suas pesquisas. "Foi uma proposta que pensamos também para complementar lacunas de nossas formações". Ele acrescenta que a escolha do tema foi determinante para a decisão de experimentar um novo formato para o evento. "Ao estabelecer um foco específico sobre uma dimensão da pesquisa, entendemos que o formato tradicional, de apresentação de trabalhos, não seria o mais adequado. Como a ideia era discutir as metodologias nas práticas de pesquisa, nada mais cabível que pensar num formato mais prático também. No sentido de produzir materiais, reflexões e discussões no próprio workshop". A comissão organizadora também contou com Jéssica Cardoso, Carlos Javier Villegas e com o líder do grupo, o Prof. Marko Monteiro.
Debates antigos, ainda atuais
Após um café da manhã compartilhado, o Prof. Marko Monteiro fez uma fala que abriu os trabalhos na manhã do dia 11 de setembro de 2023. Em pouco menos de meia hora, Monteiro cobriu algumas das polêmicas e desafios contemporâneos do campo de CTS e abordou a importância de se debater novas e antigas metodologias. Se pesquisar com não-humanos é uma prática já muito bem estabelecida no campo dos ESCT, muitas dúvidas ainda surgem sobre quais métodos os pesquisadores podem utilizar para pesquisá-los. Como seguir e estudar objetos que não podem nos dar respostas diretas? Como garantir que a pesquisa não estaria projetando nos não-humanos concepções prévias que não podem ser diretamente disputadas pelos objetos em questão?
"Eu sempre falo pros alunos: porque você está fazendo esse tipo de pergunta? Porque esse recorte, esse objeto? O que isso responde? Então não é simplesmente instrumentalizar pergunta e adequação metodológica, mas entender de modo mais profundo esse lugar na teoria que você tá colocado".
Um antigo debate do campo em torno dos efeitos dos chamados "construtivismos" ganhou atenção na fala do professor. Os construtivistas reúnem uma diversidade de perspectivas teóricas, que colocam problemas metodológicos importantes. Dentro desta diversidade, acabam se estabelecendo numa posição desconfortável: advogam que aspectos materiais do mundo sejam considerados na pesquisa social ao mesmo tempo em que explicitam como a ciência e a realidade também são socialmente construídas. Sem abrir mão do princípio de que a ciência e tecnologia são sempre permeadas pela política, o construtivismo abriu o campo para novas possibilidades, mas também foi duramente criticado.
Uma das críticas mais contundentes, que comumente vem de pesquisadores das ciências naturais, é a ideia de que o relativismo construtivista enfraquece as verdades científicas, num contexto de aumento de relevância social do negacionismo. Marko Monteiro reforça seu ponto de vista de que esse diagnóstico seria equivocado. "Eu sempre acho que não é por aí. Ser construtivista não quer dizer que você tá sendo niilista. Que tudo é relativo e nada é verdadeiro. Não é o construtivismo que está fazendo a ciência, a democracia ou as sociedades ocidentais serem criticadas". A epidemia de pós-verdade e negacionismo é multifatorial e discutir a verdade e a realidade nos processos científicos permanece sendo tema muito atual. Tendo os atravessamentos entre ciência e política como premissa, o debate precisa se aprofundar para que se possa fazer críticas à produção científica de modo responsável. O professor deixa claro: não há soluções fáceis.
Três grupos para debater metodologias
Há caminhos possíveis que não reduzam o debate em termos de relativismo e negacionismo? Diante da fala de abertura, os participantes puderam repensar como as escolhas de metodologia podem impactar aspectos teóricos e éticos de seus trabalhos no estudo da ciência e da tecnologia. Após a conversa de abertura, os 17 participantes foram divididos em três pequenos grupos de trabalhos que estavam previamente determinados e com temática pré-definida. O grupo de pesquisa etnográfica foi liderado por Jean Miguel (Unicamp), o de pesquisa teórica e meta-teórica foi liderado por Tiago Duarte (UnB) e o de pesquisa documental e entrevista foi liderado por Rosana Monteiro (UFG). Na segunda parte da reportagem escrevo sobre o trabalho dos grupos em si.
Comments