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Grupo de Estudos Interdisciplinares em Ciência e Tecnologia

Entrevista com Marko Monteiro: 10 anos de GEICT e o campo ESCT

O Dr. Marko Monteiro é o líder do GEICT e fundou o grupo em 2011. Na entrevista que segue, conversamos sobre a formação do grupo e sobre o campo dos Estudos Sociais da Ciência e Tecnologia.






 


Yama Chiodi: Oi Marko, bom dia. A minha primeira pergunta é sobre a formação do grupo. Como o grupo surgiu? A ideia veio logo depois que você passou no concurso?


Marko Monteiro: O grupo surgiu em 2011, e não era algo que estava nos meus planos ao entrar como docente na Unicamp. Mas ao me envolver mais com o trabalho docente e conhecer o DPCT, eu comecei a pensar que seria uma boa ideia iniciar meu próprio grupo de pesquisa. Isso ficou mais claro ao me envolver com os grupos já existentes no departamento, especialmente aqueles mais relacionados aos ESCT. Percebi que a dinâmica dos grupos, como funcionavam e o que queriam alcançar não era exatamente aquilo que eu buscava. Mas a possibilidade de iniciar um grupo só ficou mais clara pra mim quando eu comecei a ter meus próprios orientandos de pós-graduação, que é uma das nossas principais atividades. Percebi que o grupo poderia ser um espaço de produção de conhecimento constante, de discussão de ideias e projetos, de descoberta de conceitos e autores e de invenção teórica e prática propriamente dito. A 1a geração do GEICT foi também especialmente criativa e produtiva, algo que raramente vi depois: pessoas engajadas em criar aquele espaço de troca, em dedicar seu tempo ao debate e à reflexão. Foi esse grupo, mais do que uma pessoa, que na verdade "criou" o GEICT. Acho que percebemos que queríamos coisas parecidas: um espaço de troca mais livre de ideias, de descoberta de teorias e metodologias que não eram debatidas em outros grupos e que queríamos experimentar formatos novos de fazer a pesquisa em ESCT.


" 1a geração do GEICT foi também especialmente criativa e produtiva, algo que raramente vi depois: pessoas engajadas em criar aquele espaço de troca, em dedicar seu tempo ao debate e à reflexão. Foi esse grupo, mais do que uma pessoa, que na verdade "criou" o GEICT".

Y: Desde o princípio foi liderado por você ou havia outros professores do IG também?


Marko Monteiro: Sempre foi liderado por mim, e infelizmente não tivemos outros docentes envolvidos. Isso eu sempre achei que fortaleceria o grupo, mas creio que a falta de concursos e novos docentes também sempre foi um entrave para o crescimento do GEICT no departamento.


Y: Quando você chegou no IG, a ideia já era fazer pesquisa no campo dos Estudos Sociais da Ciência e da tecnologia?


Marko Monteiro: A minha chegada estava relacionada a um projeto Jovem Pesquisador da FAPESP, cujo tema era Antropologia da Ciência e da Tecnologia. Eu me nomeava, portanto, como antropólogo da ciência, numa tradição de estudos de laboratório a la Latour, e não estava tão atento a todo o escopo do debate nos ESCT ainda. Isso foi uma das coisas que sempre buscamos superar no começo do GEICT: essa separação muito grande entre grupos de pesquisa e tradições teóricas, mesmo dentro de uma mesma universidade, que mal se conheciam ou dialogavam. Uma das atividades que fazíamos logo no início foi promover encontros de grupos CTS (Ciência, Tecnologia e Sociedade), que eu pensava que seria um rótulo mais abrangente e inclusivo. A ideia era reunir grupos de toda a universidade, na tentativa de criar mais diálogos entre as diferentes tradições teóricas existentes. Esse encontro ocorreu por vários anos, sempre com participação central do GEICT. Foi desses encontros que nasceu a lista de emails 'CTS Unicamp', que foi outra tentativa de conectar os grupos e os debates. Percebi nesse processo que sempre estive muito atento aos ESCT, mesmo que não conhecesse esse rótulo propriamente; e que sempre buscava exatamente essa discussão. Além disso, percebemos um grande interesse de alunos e docentes por aprofundar o debate. Os encontros de grupos de CTS na Unicamp infelizmente pararam durante a pandemia, mas creio que a separação e a distância entre os diferentes núcleos de debate CTS na Unicamp (seja no DPCT, no IFCH, no Labjor e na FCA) hoje em dia são muito menores do que eram em 2011, quando começamos.


Y: Você pode falar um pouco sobre o campo dos ESCT para quem não está familiarizado?


Marko Monteiro: Difícil resumir um campo tão heterogêneo e extenso para uma entrevista assim, mas vamos lá: o campo de estudos sociais da C&T é um esforço interdisciplinar de repensar a ciência e a tecnologia como produtos da ação humana e social, e não apenas como artefatos inertes (no caso da tecnologia) ou como revelações da verdade sobre a natureza (no caso da ciência). Desse modo, o campo reúne pessoas, conceitos e métodos de áreas diversas, como sociologia, filosofia, antropologia, história, comunicação, economia, administração, dentre outras, para tentar abarcar o que seriam essas interações entre C&T e sociedade. Desde tentativas de repensar a explicação do que é o conhecimento científico, a partir de um deslocamento de explicações positivistas (a ciência é a verdade sobre fenômenos naturais; os cientistas revelam conhecimento verdadeiro a partir de métodos racionais), até tentativas de entender como C&T participam de controvérsias sobre saúde, riscos climáticos, poluição, etc. Os ESCT produzem uma riqueza muito grande de estudos de caso sobre a produção mútua entre C&T e sociedade. Ou seja, esses âmbitos do social e do científico e tecnológico não são separados, mas se interpenetram e se co-produzem continuamente. Tentar entender isso é o nosso objetivo, seja para descrever de forma mais rica o processo científico, seja para entender relações de poder relacionados a diferentes tecnologias, seja para pensar regulação ou políticas de C&T.



"O campo de estudos sociais da C&T é um esforço interdisciplinar de repensar a ciência e a tecnologia como produtos da ação humana e social, e não apenas como artefatos inertes (no caso da tecnologia) ou como revelações da verdade sobre a natureza (no caso da ciência)".


Y: Você é um antropólogo de formação. O que te motivou a entrar no DPCT? Você teve que fazer adaptações na sua pesquisa?


Marko Monteiro: Foi menos motivação do que a pura necessidade de trabalhar! Eu sempre me identifiquei como antropólogo, além de me entender como cientista social. Tentei diversos concursos na área de antropologia, sem sucesso. Percebi, como muitos colegas, que eram raros os concursos que aceitavam uma formação interdisciplinar, como era a minha: sou doutor em Ciências Sociais pela Unicamp, e não doutor em Antropologia. Até hoje, muitos concursos pedem titulação de doutorado (ou até mesmo graduação) em áreas disciplinares, excluindo profissionais que seriam talentosíssimos mas que escolheram programas de pós-graduação interdisciplinares para estudar. Infelizmente isso não mudou muito desde o início dos anos 2000. Quando conheci o DPCT, logo me interessei, por ser um dos únicos lugares que encontrei que tratava do debate dos ESCT diretamente. Conheci uma profissional fantástica, a profa. Lea Velho, que me aceitou como pós-doutorando (naquela época sem bolsa), e que me incentivou a me envolver mais com o DPCT. Quando surgiu uma vaga, disputei e consegui ser contratado. Ou seja, são partes da vida que nos escolhem, mas entendo que foi o melhor lugar para que eu pudesse desenvolver as minhas pesquisas.



"Quando conheci o DPCT, logo me interessei, por ser um dos únicos lugares que encontrei que tratava do debate dos ESCT diretamente. Conheci uma profissional fantástica, a profa. Lea Velho, que me aceitou como pós-doutorando (naquela época sem bolsa), e que me incentivou a me envolver mais com o DPCT. Quando surgiu uma vaga, disputei e consegui ser contratado".

Y: Estar dentro de um instituto de Geociências impacta as atividades de ensino, pesquisa e extensão do DPCT? E do GEICT?


Marko Monteiro: Sim, o contato constante com geologia e geografia enriquece nosso olhar, que se torna muito mais atento a um público que não necessariamente compartilha de conceitos e premissas com as quais trabalhamos. Ficamos mais atentos e preocupados em compartilhar ideias e colaborar com cientistas naturais, além de conhecer muito mais problemáticas ambientais, por exemplo.


Y: Eu como membro do GEICT participei da organização de muitos eventos que foram liderados pelo grupo. Primeiramente, queria perguntar sobre o workshop do GEICT. Como surgiu a ideia de realizá-lo?


Marko Monteiro: Os Workshops ocorrem desde o começo do grupo, em 2012 já tivemos nosso 1o evento. No começo eram pensados como oficinas de trabalho nossas, para trabalhar textos e tentar melhorar nossas publicações. Com o tempo, o evento cresceu, e passamos a chamar pessoas de fora para debater os trabalhos. Fizemos eventos em conjunto com outros grupos e outras universidades, como a Ufscar.


Y: Que outros eventos você poderia citar?


Marko Monteiro: Fomos parte dos primeiros esforços de juntar os grupos CTS da Unicamp. Mas infelizmente, esse evento não tem ocorrido mais. Outro evento do qual sempre participamos é a React, a Reunião Brasileira de Antropologia da C&T. E com frequência participamos também de eventos da Esocite (Asociación Latinoamericana de Estudios Sociales de la Ciencia y Tecnologia), seja a parte brasileira, seja a latinoamericana.


Y: Você tem ideia de quantos pesquisadores já passaram pelo GEICT ao longo dos anos?


Marko Monteiro: Nunca fiz essa contabilidade, mas foram algumas dezenas!


Y: Além de pessoas da pós-graduação, pós-docs e pesquisadores convidados, já tivemos algumas visitas ilustres que foram trazidas à UNICAMP por iniciativa do GEICT. Você se lembra de alguns que podemos destacar aqui?


Marko Monteiro: Creio que alguns importantes foram Casper Jensen, com quem tivemos um ótimo diálogo por conta da React de 2013, que organizei juntamente com Daniela Manica e Pedro Peixoto. Outro convidado ilustre foi a Dra. Sophie Haines de Oxford, que fez uma palestra em 2018 sobre infraestruturas.


Y: Ao longo dos anos o GEICT também esteve envolvido em parcerias de pesquisa com universidades do exterior, certo? Você pode falar um pouco sobre essas parcerias?


Marko Monteiro: Uma grande parceria foi ao longo do projeto RRI Practice (www.rri-practice.eu), que envolveu muitas universidades do mundo todo, especialmente da Europa e EUA. Envolveu uma ótima parceria com a universidade de Wageningen, na Holanda, com quem colaboro bastante ainda hoje (nomes como Phil Macnaghten, que esteve na Unicamp por alguns anos; e David Ludwig e Luis Reyes-Galindo, com quem trabalhei mais recentemente). Atualmente ainda desenvolvo trabalhos sob supervisão das Universidades de Harvard e Cornell, o projeto Comparative Covid Response - CompCore, sobre Covid 19 (https://compcore.cornell.edu/).


Y: Quais são suas expectativas para o futuro do GEICT agora que voltamos aos poucos a ter um movimento mais parecido com o que havia antes da pandemia?


Marko Monteiro: Ainda estamos longe de ter o mesmo engajamento que tínhamos em 2018 ou mesmo 2019: as pessoas não possuem a mesma relação com o campus e com o grupo que tínhamos antes, e isso é uma das grandes perdas que tivemos com a Covid. Minha expectativa mesmo assim é grande: temos muita gente nova, com novas ideias e projetos. Crescemos muito desde o nosso início, e temos reconhecimento nacional e mesmo internacional. Temos um novo site e um blog renovado, o que promete ampliar o alcance do nosso trabalho. Acho que temos um belo futuro pela frente, e espero cooperar muito mais com grupos no Brasil e no exterior.


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Grupo de Estudos Interdisciplinares em Ciência e Tecnologia, 2023. 

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